TOXINA TETÂNICA
Mecanismo de Ação
O mecanismo pelo qual a toxina tetânica entra no organismo humano e “viaja” até ao seu local de atuação pode ser esquematicamente dividido em 8 passos principais e encontra-se representado na Figura 3. (Rossetto et al. 2013):
Figura 3. Representação esquemática do mecanismo de ação da toxina tetânica.
Cada um dos algarismos refere-se às diferentes etapas do processo mencionadas à direita.
Adaptado de: (Rossetto et al. 2013)
1. Ligação da toxina a terminais nervosos periféricos
2. Endocitose da Toxina Tetânica
3. Transporte axonal retrógrado
4. Libertação da toxina no espaço inter-sináptico
5. Ligação da toxina à membrana do interneurónio inibidor
6. Endocitose da toxina
7. Translocação da cadeia L
8. Clivagem da VAMP
1. Ligação da toxina a terminais nervosos periféricos:
Normalmente a principal via de entrada no ser humano é através pele lesada (feridas), em situações de baixa tensão de oxigénio ocorre a germinação dos esporos que levarão à presença dos microrganismos no indivíduo afetado. Uma vez “instalada”, a bactéria sintetiza diversos componentes entre os quais a tetanospasmina.
A neurotoxina liberta-se no momento da autólise bacteriana e atinge, rapidamente, os fluídos biológicos, inclusive o sangue. Seguidamente, atinge a membrana pré-sináptica dos neurónios motores periféricos (sendo estes os principais alvos periféricos da toxina, existindo ainda algumas evidências de que a toxina se pode ainda ligar a terminais sensoriais e adrenérgicos).
Nesta fase o domínio contendo o C-terminal (presente na cadeia H, mais concretamente no domínio HC-C) liga-se a gangliosídeos (através da sua porção oligossacárida) que estão presentes nos terminais nervosos periféricos e que são responsáveis pela ligação da toxina à membrana nervosa pré-sináptica.
2. Endocitose da Toxina Tetânica:
A estrutura química do(s) recetor(es) envolvidos na endocitose da toxina com formação de uma vesícula ainda permanece desconhecida. Mas pensa-se que este tipo de recetor seja uma única molécula membranar capaz de mediar todo este segundo passo.
3. Transporte axonal retrógrado:
As vesículas, contendo a toxina no seu interior, movem-se ao longo do axónio, desde o corpo celular até às dendrites dos neurónios motores.
4. Libertação da toxina no espaço inter-sináptico:
Terminado o processo de transporte axonal, a neurotoxina tetânica é libertada na fenda sináptica que ocorre entre o neurónio motor e o interneurónio inibidor.
5. Ligação da toxina à membrana do interneurónio inibidor:
A natureza química do recetor que medeia o reconhecimento e, consequente ligação da toxina à membrana nervosa pré-sináptica, permanece também desconhecida. Porém, existem algumas suspeitas de que este processo de reconhecimento está de alguma forma relacionado, uma vez mais, com gangliosídeos e recetores de glicoproteínas que existem nestas estruturas celulares.
6. Endocitose da toxina:
Após a ligação da toxina aos recetores presentes no interneurónio, ocorre a sua incorporação numa vesícula, tal como acontece no 2º passo. No entanto, neste caso o lúmen da vesícula apresenta uma característica diferencial indispensável para a atuação da metaloprotease: a vesícula apresenta um pH acídico.
7. Translocação da cadeia L:
Na presença de um pH acídico ocorre a passagem dos domínios L e HN para a membrana da vesícula; posteriormente ocorre a translocação da cadeia L para o citosol da célula nervosa. Nesta fase é indispensável que ocorra uma redução da ponte dissulfureto, que une as duas cadeias polipeptídicas que constituem a toxina, permitindo a libertação da cadeia L.
8. Clivagem da VAMP:
A cadeia leve da toxina é responsável pela atividade de metaloprotease que é exercida especificamente sobre a proteína VAMP (da terminologia anglo-saxónica: Vesicle-Associated Membrane Protein) também designada de sinaptobrevina. Esta, tal como o próprio nome indica, é uma proteína integral da membrana das vesículas secretoras de neurotransmissores.
Esta proteína interage com a SNAP-25 e a sintaxina (ambas proteínas existentes nas membranas nervosas pré-sinápticas) formando um complexo heterotrimérico que é responsável pela fusão das vesículas sinápticas (que contêm neurotransmissores como o GABA (ácido gama-aminobutírico) e a glicina) com a membrana plasmática, levando assim à libertação de neurotransmissores no espaço sináptico.
Figura 4. Representação esquemática do que ocorre durante o 8º passo do mecanismo de ação da toxina tetânica.
Adaptado de: (Calvo et al. 2012)
A cadeia L da toxina promove a clivagem da ligação peptídica existente na VAMP (entre a Glicina 76 e a Fenilamina 77).
Com esta inativação da sinaptobrevina, deixa de haver complexação com as proteínas membranares referidas (SNAP-25 e sintaxina) e, consequentemente, não ocorre a libertação dos neurotransmissores na sinapse.
Todo este processo está ilustrado na Figura 4.
Bibliografia:
[1] Rossetto O, Scorzeto M, Megighian A, Montecucco C (2013) Tetanus neurotoxin. Toxicon 66:59-63
[2] Calvo AC, Oliván S, Manzano R, Zaragoza P, Aguilera J, Osta R (2012) Fragment C of Tetanus Toxin: New Insights into Its Neuronal Signaling Pathway. International Journal of Molecular Sciences 13:6883-6901